Realidade atual

Durante um mês e meio o Jornal da Globo acompanhou a investigação da CPI do Sistema Carcerário com a seguinte conclusão de reportagem:
Se o RETRATO do que acontece atrás das grades de uma prisão é o ESPELHO de uma SOCIEDADE, o Brasil pode entender a barbárie da qual se queixa nas ruas. Dentro das cadeias é ainda pior, conforme a reportagem intitulada APAGÃO CARCERÁRIO. Em várias partes do Brasil as equipes de reportagem mergulharam num sistema que parece funcionar apenas para perpetuar o horror, e que torna quase impossível pensar na recuperação de quem entrou nele. Isso aqui é uma fabrica de doido, porque não tem espaço pra gente aqui, declara um detento. A comida ta uma porcaria, declara um detento.
Um descaso, nós estamos largados à própria sorte, alega outro detento.
As equipes visitaram porões, corredores, pátios e celas de uma estrutura falida, insegura, malcheirosa... um depósito de gente. O Brasil tem 422 mil presos. São necessárias mais 185 mil vagas.
Só vejo grades, paredes, até muralhas, mas meus pensamentos eles nunca atrapalham, conta o rapper Osmildo Santos, preso por assassinato no instituto Penal Paulo Sarasate, na região metropolitana de Fortaleza. No presídio a polícia descobriu em fevereiro de 2008, um túnel de 45 metros, faltou pouco para os presos alcançarem o lado de fora.
O mundão aí fora, as crianças, os jovens, ESTUDAM. Não queira vir para cá não, porque aqui é o inferno, alerta Osmildo Andrade Santos, preso.
O inferno nesta Penitenciária tem um apelido, selva de pedra: uma ala onde ficam os presos mais perigosos do Estado. O aparato de segurança tem uma explicação: a polícia foi informada de que haveria uma arma de fogo com os detentos.
Minutos depois da saída da equipe do Jornal da Globo, dois presos foram assassinados lá dentro com pedaços de ferro. Um deles estava com um cadeado na boca. Um recado macabro para quem, na lei do crime, fala demais.
Em 2007, segundo o Ministério da Justiça, 1048 presos morreram dentro de cadeias e presídios brasileiros. Já para a CPI do Sistema Carcerário, o número é maior: 1250 mortos.
A média é de três mortes por dia. O presídio Urso Branco em Porto Velho é um exemplo dessa violência. O local ficou famoso no mundo todo por causa das cenas de horror nas rebeliões de 2002 e 2004.
Nos últimos cinco anos, mais de 100 presos foram assassinados dentro da cadeia. A maioria vitima de colegas de cela. Uma faca artesanal para cometer o crime. Mas em dezembro do ano passado, um agente penitenciário foi surpreendido ao fazer uma revista Ele levou um tiro no peito e morreu. Os presos estavam com dois revolveres dentro da cela.
A reação da polícia deixou marcas. Dois presos foram mortos. O responsável por entregar as armas aos detentos, outro agente penitenciário que acabou preso. Um ato que provocou mortes e um sentimento de revolta.
Revolta porque ele não só colocou a vida dos companheiros, ele colocou todo mundo em risco de vida , declara wildney Jorge de Lima, diretor geral do Urso Branco.
Estar na cadeia é correr risco seja preso, funcionário, policial ou visita. A dentista só concorda em tratar do paciente se ele estiver algemado. Para o detento, ficar numa ala dominada por uma facção rival é ser vizinho da morte.
Se eles souberem da gente, eles vão cortar nossa cabeça, então a gente corre perigo e nossos familiares não estão sabendo disso e nós precisamos sair daqui, fala um detento.
O perigo é real diz um agente penitenciário que pediu para não ser identificado. Ele conta que já viu diretor de presídio, por medo ou vingança, ordenar a transferência do preso para uma cela onde o detento só tem inimigos.
O cara chora, diz pelo amor de Deus. Mas a gente bota lá dentro. É determinação lá de cima. No outro dia o cara ta morto. Já aconteceu, acontece e vai continuar acontecendo , conta o carcereiro.
A Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados recebeu em 2007, 60 denúncias de violência contra presos.
A gente não pode olhar pra eles, pedir uma regalia aqui, ou então uma melhoria, eles tiram a gente, às vezes, algemado e espanca lá fora, conta um detento.
O agente penitenciário diz que os espancamentos são comuns e explica por quê. Hoje uma cadeia superlotada, se não tiver, é até contraditório isso, mas se não tiver porrada, tem rebelião. Se você não quebrar os presos, eles vão vir pra cima de ti e vão te quebrar. Então é a sobrevivência do mais forte. Ou tu é a caça ou é o caçador, alega.
Em Minas Gerais nos deparamos com a imagem do caos, que no local atende pelo nome de cadeia pública. Flagramos as celas abarrotadas. Em um distrito policial, em Contagem, no dia da visita da equipe do JG, 34 homens dividiam o espaço que seria para no máximo 15.
Tem dois meses que a gente ta aqui e não recebe nenhuma visita, fala o preso.
Na maioria das cadeias públicas do país, para dormir só revezando. Metade em pé, metade deitada, porque tem 21 presos onde cabe seis , fala o detento.
Cada preso no Brasil custa R$ 2.100,00 por mês aos cofres públicos. É bem mais do que ganha um agente prisional em Goiás, que precisou comprar algemas, porque o estado não fornece.
Meu salário é R$ 640,00 líquido, o contrato é de R$ 700,00, conta Humberto Stefan, vigilante penitenciário. 
É um sistema falido, caótico, precário, terá muita dificuldade de recuperar um sequer, diz o deputado Neucimar Fraga, presidente da CPI do Sistema Carcerário.
O produto que sai do presídio é um individuo que está maximizado na carreira do crime, ele já aprendeu a praticar o crime e ele sabe que não ficará muito tempo preso. Isso foi a falência do sistema penal em longo prazo e é o problema que nós enfrentamos hoje. Fala Marcio Christino, promotor de justiça Criminal SP.
É nesse ambiente que padre Marco fala de paz e amor há mais de 12 anos.
Questionado sobre se é difícil falar de deus na cadeia, o padre Marco Pacerini coordenador da pastoral Carcerária diz: Acho que é mais difícil falar de Deus fora da cadeia, falar de Deus para os juízes que falam em nome de Deus, falar de Deus para os desembargadores que falam em nome de Deus, para a sociedade que enche a boca de Deus, para os evangélicos, os católicos e que deixam acontecer esse desrespeito à pessoa humana. A minha dificuldade é falar de Deus, de justiça, lá fora, não é aqui .